A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) tem sete projetos em andamento na busca por uma vacina brasileira eficaz contra a Covid-19.

A professora da Faculdade de Farmácia da UFMG e uma das coordenadoras do CTVacinas, Ana Paula Fernandes, afirma que além da busca por uma resposta rápida para frear a Covid-19, estão sendo criadas bases para a produção de imunizantes contra outras doenças no futuro.

“Todo o conhecimento adquirido nos estudos para a vacina contra a Covid-19 será útil para que possamos criar vacinas contra outras doenças, visto que alguns processos se repetem em todo o percurso de desenvolvimento de um imunizante. Além disso, desenvolver os passos de uma vacina no Brasil é fundamental para a soberania nacional, pois nos garante certa independência no combate às doenças”, diz.

No CTVacinas, são três imunizantes que utilizam plataformas de vetores virais, um baseado em proteína recombinante e outro que utiliza DNA. Já no ICB, uma das vacinas desenvolvidas utiliza RNA, e a outra, bacilos de Calmette-Guérin (BCG).

Fase de testes pré-clínicos

As sete vacinas estão na fase de estudos pré-clínicos, aquela em que os pesquisadores avaliam a sua imunogenicidade, ou seja, a capacidade da substância de provocar uma resposta imune do organismo por meio do desenvolvimento de anticorpos que combatem a doença. Essa fase também atesta os níveis de proteção e segurança do imunizante em animais.

Segundo Ana Paula Fernandes, todas as plataformas utilizadas nas pesquisas feitas na UFMG já são usadas no desenvolvimento de vacinas contra outras doenças, o que ajuda a garantir a segurança dos imunizantes. Além disso, apesar de todas essas vacinas ainda estarem na fase pré-clínica dos estudos, cada uma delas apresenta complexidades próprias e seria produzida de maneira diferente, no caso de eficiencia comprovada. 

“Precisamos lembrar que a produção de uma vacina é um processo complexo. Para ganharmos tempo, embora ainda estejamos na fase de testes em animais, o CTVacinas já está conversando com as fábricas que poderão produzir os imunizantes para as fases de testes clínicos em humanos. Também estamos conversando com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que, quando autorizadas as fases clínicas, isso seja feito o mais rapidamente possível. O Brasil tem pressa para vacinar a sua população, então é importante que consigamos financiamento para as próximas etapas dos estudos”, disse.

As vacinas em teste

Vírus MVA usado como vetor: utiliza, como plataforma, o vírus MVA, que já é empregado como vetor na vacina contra a varíola. O vírus MVA recebe genes do Sars-CoV-2 e passa a produzir as proteínas S (Spike) e N (do nucleocapsídeo viral) do novo coronavírus, que são utilizadas por ele para infectar as células humanas. Em contato com as células do paciente, o vírus induziria o organismo à resposta imune contra a covid-19. Essa vacina prevê a imunidade por meio de duas doses, aplicadas em via intramuscular. Os estudos que podem dar origem ao imunizante estão sendo financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio de edital do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

Vírus Influenza usado como vetor: também prevê a aplicação em duas doses, porém por via intranasal. Nesse estudo, foram feitas alterações genéticas no vírus H1N1, que causa a gripe. Depois dessas alterações, o vírus da gripe tornou-se capaz de transportar parte da proteína S do Sars-CoV-2, que possibilita que o vírus infecte as células humanas. A intenção é que, depois de inserido no organismo, o vírus dotado dessa parte dessa proteína estimule o corpo humano a produzir os anticorpos para a covid-19, ao mesmo tempo que protege o organismo da influenza, tornando-se assim uma vacina ambivalente. Essa pesquisa é feita em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Universidade de São Paulo (USP), com financiamento do CNPq, do MCTI e da Fundação Oswaldo Cruz.

Adenovírus (Ad5) usado como vetor: também de administração intramuscular e aplicada em duas doses, essa vacina consiste na modificação genética do Adenovírus 5, que provoca infecções respiratórias. Os cientistas inserem partes do genoma do Sars-CoV-2 no adenovírus, que se torna capaz de produzir as proteínas S e N do coronavírus (as utilizadas pelo vírus para infectar as células humanas). O produto será então introduzido no organismo humano, estimulando-o a produzir anticorpos contra a covid-19. O mecanismo é o mesmo empregado no desenvolvimento da vacina Oxford/AstraZeneca. A pesquisa é financiada pelo CNPq, por meio de edital do MCTI.

Proteína recombinante (“quimera”) usada como plataforma: bastante versátil, essa vacina é considerada a mais fácil de ser produzida. A administração é intramuscular, em duas doses. A pesquisa que deu origem ao desenvolvimento desse imunizante baseou-se na modificação genética da bactéria E.coli, que recebeu pedaços do genoma do Sars-Cov-2 para que fosse possível produzir as duas proteínas que o coronavírus utiliza para infectar as células humanas (as proteínas S e N). O composto, chamado de “quimera”, é então injetado no corpo humano e induz à resposta imune. Por ter um método de produção mais simples, essa vacina poderia ser produzida na Fundação Ezequiel Dias (Funed), em Minas Gerais. A pesquisa é financiada pelo CNPq e pelo MCTI.

DNA: é o imunizante mais adiantado entre os que estão sendo desenvolvidos no CTVacinas. Os antígenos do Sars-Cov-2 são incluídos em um plasmídeo, o que promove sua expressão nas células do organismo e apresentação ao sistema imune, induzindo à resposta celular de defesa. Mais estável que o RNA, o DNA viabiliza que essa vacina seja mais facilmente trabalhada, uma vez que ela pode ser armazenada em freezers comuns, facilitando, assim, o armazenamento e a logística de distribuição. O processo de produção se assemelha ao das vacinas de RNA, porém com o acréscimo de uma etapa, a de transcrição do DNA em molécula de RNA. A pesquisa é financiada pelo CNPq e pelo MCTIC.

RNA mensageiro: o mRNA (ou RNA mensageiro sintético) é encapsulado por um elemento transportador de proteínas, o lipossomo. Tal estrutura tem fácil acesso às células do corpo humano depois de inoculada porque é reconhecida como um elemento do organismo. Já dentro da célula, o composto mimetiza a proteína S do vírus Sars-Cov-2, incentivando a resposta imune do organismo. Essa vacina, que pode ser facilmente adaptada para eventuais mutações do coronavírus, tem aplicação intramuscular, em duas doses. O projeto é financiado pelo CNPq, por meio de edital do MCTI. 

Bacilos de Calmette-Guérin (BCG) usados como vetores: de aplicação intramuscular, essa vacina baseia-se na inserção de sequências do genoma do Sars-Cov-2 em bacilos de Calmette-Guérin (BCG), os causadores da tuberculose. O objetivo é que a modificação genética induza os bacilos a produzir as proteínas S e N do Sars-Cov-2. A vacina é ambivalente, pois, depois de inserido no organismo, o composto o estimula a produzir anticorpos contra covid-19 e a própria tuberculose. Esse imunizante é considerado muito seguro porque parte de uma vacina já bem conhecida, a BCG. Isso gera expectativa de mais rapidez nas fases de testes em humanos. A vacina está sendo desenvolvida em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o Instituto Butantan, com financiamento do CNPq e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Cinco destes projetos ocorrem em parceria com a Fiocruz-Minas e com o Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC). Outros dois tem parceria com o Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

Com informações de UFMG

Com imagem de sob licença CC BY 3.0