De 25 a 29 de outubro, os Estados-Membro das Nações Unidas prosseguiram com as negociações para a elaboração de um instrumento internacional legalmente vinculativo (LBI, na sigla em inglês) para regular, na legislação internacional dos direitos humanos, as atividades das corporações transnacionais (CTNs), incluindo todas as empresas ao longo de suas cadeias globais de produção. Esta é a sétima sessão do Grupo de Trabalho Intergovernamental de Composição Aberta, organizado pelo Conselho de Direitos Humanos em Genebra, que está revisando o terceiro rascunho do tratado vinculante, publicado em 17 de Agosto de 2021, e que faz parte do processo de negociações iniciado em 2014 com a adoção da Resolução 26/9 por parte do Conselho de Direitos Humanos.

A Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, abriu a sessão defendendo que o mundo está testemunhando um “crescente consenso sobre a necessidade de normas vinculativas sobre empresas e direitos humanos”.

As negociações em torno do Tratado Vinculante da ONU – como é comumente conhecido – deram um salto qualitativo com a nova metodologia adotada para esta sessão, que trouxe transparência e incentivou os Estados a posicionarem-se sobre a linguagem específica do rascunho do tratado. Um total de 69 Estados participaram da sessão, ao longo de toda a semana. Mais importante ainda, alguns conteúdos principais e indispensáveis ​​foram reintroduzidos e defendidos por alguns Estados, de acordo com o mandato da Resolução 26/9, com vista a preencher as lacunas do direito internacional dos direitos humanos que permitem a impunidade das empresas transnacionais. Entre outros, notamos a positiva e construtiva participação da África do Sul, Egito, Palestina, Camarões, Namíbia, Panamá e Cuba.

“Muitos Estados estão negociando obrigações legais diretas e claras para as empresas transnacionais e outras empresas com atividades transnacionais, superando as limitações normativas a nível nacional, que contribuem para a impunidade. Queremos destacar a importância das propostas que têm defendido a primazia dos direitos humanos sobre os direitos das empresas em toda a cadeia produtiva global”, afirma Julia Garcia, do Movimento Atingidos por Barragens (MAB) e coordenadora da Campanha Global.

Como todos os anos, foi fundamental o papel da sociedade civil, defendendo a continuidade deste processo e fornecendo análises detalhadas, argumentos fortes e propostas de conteúdo muito concretas. A Campanha Global para Reivindicar a Soberania dos Povos, Desmantelar o Poder Corporativo e Acabar com a Impunidade (Campanha Global), representando 260 milhões de pessoas globalmente afetadas por corporações transnacionais, participou diretamente nas negociações, retomando parcialmente a presença física que no ano passado não foi possível devido à pandemia do COVID-19.

A Campanha Global defende um tratado ambicioso e eficaz com regras vinculativas de direitos humanos para empresas transnacionais e as demais empresas nas suas cadeias globais de produção, que são em grande parte responsáveis pela crise climática e da biodiversidade, pela exploração do trabalhador, e pelos atuais níveis de desigualdade sem precedentes. A conduta reprovável destas empresas põe em risco o futuro da humanidade e do planeta.

No entanto, existem algumas preocupações sobre o risco de perda de transparência do processo. Erika Mendes, da Justiça Ambiental e Amigos da Terra Moçambique afirma que este é o caso, particularmente, “na próxima etapa do processo de negociações, que irá avançar no formato do denominado ‘Grupo de Amigos do Presidente’ durante o período entre sessões. É importante que a nova metodologia de negociação entre Estados garanta a participação da sociedade civil, e que a voz das comunidades afetadas seja ouvida e considerada. Ao mesmo tempo, apelamos ao Presidente do OEIGWG e aos Estados para que protejam o processo da influência nefasta de poderosas corporações que, em vez de defender os direitos humanos, fazem lobby pela proteção dos seus próprios interesses econômicos”.

A Campanha Global continuará com o seu compromisso de garantir que o processo se mantém fiel ao espírito e à ambição da Resolução 26/9. Para tal, estamos nos mobilizando a nível nacional para garantir que os nossos governos participem ativamente nas negociações, representando as necessidades e aspirações dos povos de cada país.