Por: Valor Economico / Agencia de Notícias da Aids
O Ministério da Saúde assinou ontem quatro contratos de transferência de tecnologia para produção de medicamentos por meio de parcerias público-privadas. Dentre os medicamentos contemplados estão dois antiretroivirais: O Atazanavir e o Raltegravir. De acordo com o governo, trata-se de um acordo vantajoso, pois vai gerar economias significativas em médio prazo. Para a sociedade civil, no entanto, não é possível emitir opinião alguma sobre essa notícia, simplesmente porque não houve transparência nenhuma nessas negociações. Como a sociedade civil desconhece os termos do acordo, ficam muitas dúvidas sobre os detalhes dessa transferência e seus possíveis aspectos negativos. É lamentável constatar que um assunto tão importante como a produção de medicamentos antiretrovirais seja negociado a portas fechadas, especialmente em um país onde a participação da sociedade civil sempre foi fundamental para garantir a sustentabilidade do programa nacional de tratamento de HIV/AIDS.As poucas informações que temos sobre os acordos chegaram via imprensa. Confira abaixo Matérias do Valor Econômico e da Agência de Notícias da Aids.
Com PPPs, governo nacionaliza produção de mais 4 remédios
Valor Economico
O Ministério da Saúde anuncia hoje, em Brasília, a formalização de quatro novas parcerias com laboratórios privados para a nacionalização da produção de remédios contra AIDS, artrite e mal de Alzheimer, que atualmente são importados. A medida prevê reduzir um déficit anual de mais de US$ 10 bilhões da balança comercial do setor de saúde e transferir tecnologia para a indústria brasileira. Além disso, a fabricação local das novas drogas deve gerar economia anual de R$ 140 milhões nas compras governamentais e reforçar políticas públicas que visam à ampliação do acesso a medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS).
O laboratório público Farmanguinhos, ligado ao Ministério da Saúde, e o grupo privado americano Bristol Myers vão produzir o Atazanavir, para tratamento de pacientes com AIDS. A parceria entre o Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco (Lafepe) e a indústria farmacêutica americana MSD permitirá que outro antirretroviral – o RALTEGRAVIR – seja produzido no país. A Fundação para o Remédio Popular (Furp), do governo do Estado de São Paulo, e o laboratório alemão Boehringer fabricarão o Pramipexol, medicamento contra mal de Alzheimer. Já o Instituto Vital Brazil (IVB), do governo do Rio de Janeiro, e o conglomerado farmacêutico brasileiro PharmaPraxis vão desenvolver projeto de pesquisa para a fabricação da droga Adalimumabe, contra artrite reumatóide e doença de Crohn.
Os novos remédios se somarão a uma lista de 25 itens que tiveram a parceria público-privada (PPP) desenhada em 2009, de acordo com as diretrizes da Política de Desenvolvimento Industrial (PDP). As PPPs envolvem nove laboratórios públicos e 20 indústrias privadas – dez nacionais e dez estrangeiros. "Podemos dizer que o time entrou em campo, o modelo começa a gerar produtos a partir deste ano", revelou ao Valor Carlos Gadelha, secretário de Ciência e Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde.
De acordo com a pasta, a importação dos 29 medicamentos do grupo das PPPs custa ao Ministério da Saúde cerca de R$ 1,5 bilhão por ano. Sem a necessidade de importar esses remédios, o país poderá economizar cerca de R$ 1 bilhão. Somente com as PPPs das quatro drogas a serem anunciadas hoje, a economia chegará a R$ 700 milhões em cinco anos.
"Se incluirmos as vacinas será um total R$ 1,2 bilhão de economia e eficiência do gasto público. Vamos precisar de cinco anos, que é o período em que o país deve se tornar autossuficiente na produção, após conclusão da transferência de tecnologia dos laboratórios privados para os públicos", projeta Gadelha. Segundo ele, as PPPs serão estendidas para a produção de vacinas e equipamentos e materiais médicos, como máquinas de ressonância magnética, por exemplo.
O governo espera ainda que a capacidade de fabricação de medicamentos dobre em função das PPPs. "As PPPs viabilizam o aumento da autonomia do país na produção, no desenvolvimento e na inovação no setor de saúde. O fortalecimento do parque produtivo brasileiro é fundamental para o desenvolvimento econômico e social. Quanto maior a produção nacional de medicamentos, maior o acesso da população a produtos estratégicos", explica Carlos Gadelha.
Além de interesses econômicos, que visam minimizar o déficit comercial do setor de saúde, os medicamentos escolhidos para figurar na produção via PPPs também casam com a política pública de atenção farmacêutica do SUS. As ações privilegiam o aumento da produção de drogas para combater doenças que mais acometem a população brasileira, como, por exemplo, TUBERCULOSE e asma.
O acordo que firma as PPPs será assinado pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e representantes da iniciativa privada. Também está prevista a presença dos ministros do Desenvolvimento, da Fazenda, das Relações Exteriores, do Planejamento, das Comunicações e de Ciência e Tecnologia e do presidente do BNDES.
Parcerias público-privadas de produção de antirretrovirais precisam ser realizadas de forma transparente, defendem ativistas
Agência de Notícias da Aids
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, vai oficializar na tarde desta terça-feira parcerias público-privadas para a produção nacional dos antirretrovirais atazanavir e raltegravir, além de outros medicamentos. A ação vai ocorrer em Brasília durante a 1ª Reunião Ordinária do Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde (Gecis) de 2011. Ativistas ouvidos pela Agência de Notícias da Aids dizem que processo de transferência tecnológica precisa ser transparente para que seja possível realizar controle social.
“Temos realmente capacidade de produção?”, questiona Sérgio Costa, relações internacionais da ONG pernambucana Gestos- Soropositividade, Comunicação e Gênero. Sérgio defende que o Brasil precisa diminuir o déficit da balança comercial na área de medicamentos (de cerca de US$ 10 bilhões anuais), mas afirma que "as parcerias não garantem benefícios ao país".
O presidente do Grupo Pela Vidda / SP, Mário Scheffer, acrescenta que os acordos só serão vantajosos se o Brasil tiver dois resultados: aumento da capacidade de produção nacional de remédios e redução de custos. "Se o preço não for menor do que o praticado no mercado mundial, não teremos o impacto desejado”, avalia.
Desabastecimentos
O presidente do Fórum de ONG/Aids do Estado de São Paulo, Rodrigo Pinheiro, afirma que as parcerias público-privadas não garantem a diminuição de problemas de desabastecimento de remédios. “Às vezes o desabastecimento ocorre por atraso dos laboratórios. Mas há casos em que a dificuldade é do próprio Ministério da Saúde, por causa do fluxo burocrático de compra dos antirretrovirais”, argumenta.
Antirretrovirais envolvidos nas parcerias
As parcerias público-privadas entre o laboratório público Farmanguinhos e o grupo privado americano Bristol Myers Squibb; além do Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco (Lafepe) e a indústria farmacêutica americana MSD, envolvem a transferência de tecnologia de dois antirretrovirais de indicações diferenciadas.
O atazanavir é utilizado por 33 mil brasileiros que estão começando o tratamento para a aids. Já o raltegravir é indicado para terapia de resgate, quando acontecem falhas em combinações terapêuticas anteriores. Cerca de 2,5% dos 600 mil portadores de HIV do país usam o remédio. O Brasil fornece outros 18 antirretrovirais, 10 deles produzidos no país.