Por: O Estado de São Paulo
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O Estado de São Paulo – 20/09/2011
O discurso feito pela presidente Dilma Rousseff na Organização das Nações Unidas (ONU) está longe de refletir a política de seu governo em relação às patentes. Além de a defesa da licença compulsória de medicamentos ter perdido a relevância no debate nacional – e isso, em parte provocado pela falta de protagonismo da sua equipe -, a presidente se ausenta de discussões importantes. Mesmo daquelas que podem significar retrocesso na política de acesso a medicamentos no País.
A ausência mais sentida é na disputa em torno da anuência prévia, um mecanismo previsto em lei que permite à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avaliar pedidos de patentes analisados e autorizados pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).
Esse instrumento, na avaliação de entidades ligadas a políticas de ampliação de acesso a medicamentos no País, é fundamental para evitar a concessão de patentes indevidas, de medicamentos que não trazem inovação ou atividade inventiva. Isso porque a Anvisa teria critérios mais rigorosos que o Inpi na avaliação do remédios. Mas, por considerá-la uma ameaça a sua autonomia, o Inpi sempre foi contrário a essa ferramenta.
A guerra entre essas duas instituições do governo teve um desfecho no primeiro mês do governo Dilma, quando a Advocacia-Geral da União emitiu um parecer restringindo os poderes da Anvisa. Algo que, na avaliação de analistas e de próprios integrantes da Anvisa, transformavam a anuência prévia numa mera ficção legal. Esse impasse do governo poderia ter sido evitado pela presidente. Ou solucionado, com uma sinalização clara sobre o papel da Anvisa.
Outro silêncio sentido é em torno da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que está no Supremo Tribunal Federal sobre pipeline, o reconhecimento automático feito pelo governo brasileiro de patentes de remédios concedidas em outros países no período anterior à entrada em vigor da Lei de Patentes brasileira, em 1996.
Se a ação for considerada procedente pelo STF, as patentes concedidas automaticamente a pelo menos 440 remédios no Brasil passam a ser consideradas inválidas – o passaporte necessário para dar início à versão genérica dessas drogas.
Cálculo divulgado pelo Estado em fevereiro, mostrava que, num período de 19 meses, o Brasil gastou R$ 123 milhões a mais na compra da versão patenteada de apenas quatro medicamentos com patentes pipeline distribuídos no sistema público de saúde. O valor refere-se ao dinheiro que o governo economizaria se comprasse as mesmas drogas em países onde elas são vendidas na versão genérica.
Embora o Poder Judiciário tenha independência, nada impediria que governo se manifestasse favoravelmente à avaliação rápida do processo. Algo feito, por exemplo, em relação à chamada "judicialização". Mas, por enquanto, nenhum sinal claro foi emitido.
Por Lígia Formenti
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