Organizações latino-americanas se juntam para dizer “não” ao Acordo de Livre-Comércio entre Mercosul – União Europeia com um abaixo-assinado e um documento que relaciona doze razões contra as atuais propostas que estão sendo conduzidas entre os dois blocos comerciais.
A iniciativa é da organização mexicana Alianza Biodiversidad em conjunto com outras 12 organizações latino-americanas. São elas a Acción por la Biodiversidad (Argentina); Redes – Amigos de la Tierra (Uruguai); Grupo Semillas (Colômbia); Acción Ecológica (Equador); Anamuri (Chile); BASE-IS (Paraguai); Colectivo por la Autonomía (México); Red de Coordinación en Biodiversidad (Costa Rica); Centro Ecológico (Brasil); ETC Group (México); Grain (Argentina e Chile) e a articulação regional CLOC – Via Campesina.
De acordo com os organizadores, o documento será apresentado no dia 26 de fevereiro durante nova rodada de negociação que será realizada em Assunção, no Paraguai.
O documento prega a defesa de direitos conquistados em lutas históricas; à produção segura de alimentos, à soberania, entre outros.
Veja abaixo o documento em português:
12 razões porque dizemos NÃO ao Acordo de Livre-Comércio entre Mercosul e União Europeia.
Nossa agricultura, nossos ativos naturais e nossos alimentos em risco iminente!
1- Porque o acordo foi negociado em segredo e sem consultar a sociedade civil, parlamentos e organizações populares dos setores que seriam afetados em nossos países. Os únicos documentos que foram tornados públicos, que não são definitivos e não contabilizam o histórico da negociação (e, portanto, o processo de concessões mútuas em seu curso) emergiram de vazamentos, incluindo os divulgados pelo Greenpeace Netherlands como Mercosul Leaks.
2- Porque o Acordo busca beneficiar as grandes empresas do norte e as elites agro-exportadoras do MERCOSUL, disfarçando-o como “Acordo de Associação”, enquanto a agenda em negociação entre os dois blocos incorpora os elementos prejudiciais da agenda de livre-comércio, que é cada vez menos livre e lida com questões mais amplas do que as que são tipicamente comerciais, afetando seriamente a capacidade e a margem de manobra dos governos em matéria de políticas públicas para o bem-estar geral.
3- As elites do MERCOSUL buscam este Acordo para fortalecer as exportações com base em gado industrial e soja. Se assinado, o Acordo irá aprofundar os problemas que o agronegócio já produz na região: desmatamento, expulsão de camponeses, poluição por agrotóxicos, destruição de economias regionais, perda da soberania alimentar e aumento da vulnerabilidade alimentar. Os camponeses e os pequenos agricultores familiares produzem a maior parte dos alimentos na região. O modelo imposto pelo Acordo promove o controle territorial pelo agronegócio e aprofundará a violência, criminalização e perseguição que as comunidades camponesas sofrem atualmente em toda a região.
4- Porque nossas sementes serão criminalizadas, privatizadas e a sua troca e livre circulação serão proibidas. Isso acontecerá porque em matéria de Propriedade Intelectual isto está sendo negociado em todos os aspectos relacionados à regulamentação. No campo das sementes, o texto vazado diz que “cada Parte deve proteger os direitos das variedades vegetais, de acordo com a Convenção Internacional para a Proteção de Novas Variedades de Plantas, adotada em Paris em 2 de dezembro de 1961, revisada pela última vez em Genebra, em 19 de março de 1991 (ACTA UPOV 1991) “. Isso significa a imposição das Leis Monsanto em todos os nossos países.
5- No mesmo capítulo sobre Propriedade Intelectual, é imposta a adoção do Tratado de Cooperação de Patentes (Tratado PCT) que promove a facilitação da concessão de patentes em escala global. Isso pode significar a imposição da possibilidade de patentes sobre a vida, uma questão que atualmente é rejeitada pelas legislações nacionais no MERCOSUL. Além disso, o capítulo de negociação impõe novas restrições ao uso de dados de teste na indústria farmacêutica, que pode restringir à produção de medicamentos genéricos e do direito ao acesso à saúde impondo pesados encargos aos orçamentos nacionais a partir do aumento de custo dos medicamentos disponíveis.
6- As empresas nacionais estarão deslocadas já que o capítulo de serviços permite investimentos estrangeiros pelas empresas que estabelecerem suas subsidiárias no país da contraparte, com o tratamento preferencial determinado pelo Acordo. Isso significará um recuo, já que a posição inicial do MERCOSUL era de não negociar sobre investimentos.
7- O acordo restringe seriamente a soberania de nossos países estabelecendo programas e políticas da maior importância, como a adoção de medidas contra a mudança climática; contra segurança e soberania alimentar e contra o direito dos povos indígenas a consultas prévias. Apresenta clara vocação pelo aprofundamento do modelo primário de exportação, a crescente adoção de compromissos que limitam a implementação de políticas em favor da diversificação da matriz de produção, políticas de ciência soberana, políticas de inovação e pesquisa, promoção industrial e promoção de empreendimentos alternativos e sustentáveis.
8- As empresas europeias poderão concorrer nas licitações públicas promovidas por entidades governamentais da mais ampla circunscrição territorial. Isto porque na matéria das Compras do Estado, os requisitos da União Europeia significam, de fato, a imposição das condições do Acordo Plurilateral de Contratos Públicos da OMC, que não tenha sido assinado e, portanto, não obriga a qualquer dos países membros do MERCOSUL.
9- Enquanto se promove a incorporação das PME nas cadeias transnacionais de valor, o enquadramento da relação bi-regional nos rígidos esquemas de livre-comércio tornam as afirmações de caráter desenvolvimentista pouco críveis. A renúncia das compras públicas como ferramentas para promover o desenvolvimento produtivo nos setores da indústria nascente, ou da economia social e solidária, é um sinal muito negativo para as PMEs e representa uma clara contradição com os objetivos de promoção dessas unidades produtivas.
10- As medidas sanitárias e fitossanitárias continuarão a ser utilizadas pela UE para impedir o acesso dos produtos agrícolas do Mercosul ao seu mercado, e não como uma ferramenta legítima para proteger a saúde de sua população, já que isso é o que tradicionalmente faz. As intensas discussões em torno do capítulo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias, refletidas na versão vazada de junho de 2017 e intensificadas de acordo com fontes em Bruxelas, sugerem que a UE continuará a aprofundar essa tendência.
11- O capítulo sobre Empresas do Estado, que foi incorporado pela UE na mesa de negociação, fará com que os Estados se comprometam a fazer suas empresas funcionarem sob rígidas regulações comerciais, limitando a capacidade de fomentar setores da produção e a economia. A função pública é menosprezada. Este é um assunto que foi reiterado em vários acordos de livre-comércio da UE, com alguns aspectos comuns em seu conteúdo.
12- A incorporação de um capítulo sobre Comércio Eletrônico introduz outra frente de assimetrias na relação birregional. A obrigação de garantir a livre circulação de dados, a proteção dos códigos fonte e a permanência de regulamentos nacionais tão flexíveis quanto possível para a operação de corporações transnacionais, são elementos estratégicos deste capítulo. Procura congelar as condições de preeminência das grandes empresas do Norte e aprofundar a capacidade de concentrar riqueza. A definição dessas normas apenas aprofunda o oligopólio transnacional na economia digital e deixa pouca margem para a construção de políticas que apresentam alternativas à inserção periférica das economias da região no âmbito da Revolução 4.0.
Finalmente, enfatizamos que este acordo será um passo em direção a um Acordo de Livre-Comércio ainda mais abrangente que, com novos capítulos, implicará novas ameaças para nossos povos.
Estas são as 12 principais razões pelas quais consideramos que o Acordo de Livre-Comércio do MERCOSUL – União Européia não pode ser aprovado.
Documento produzido pela Aliança da Biodiversidade (México) integrada por:
– Acción por la Biodiversidad (Argentina);
– Redes – Amigos de la Tierra (Uruguai);
– Grupo Semillas (Colômbia);
– Acción Ecológica (Equador);
– Anamuri (Chile);
– BASE-IS (Paraguai);
– Colectivo por la Autonomía (México);
– Red de Coordinación en Biodiversidad (Costa Rica);
– Centro Ecológico (Brasil);
– ETC Group (México);
– Grain (Argentina e Chile);
– CLOC – Via Campesina (América Latina).
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