Por: Folha de S.P
Os principais laboratórios farmacêuticos multinacionais usaram uma associação que representa seus interesses no Brasil para repassar R$ 1,8 milhão nas eleições a 18 candidatos a deputado federal e dois ao Senado.
A Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa) agrega 35 laboratórios instalados no país que, segundo a própria entidade, representam mais da metade do faturamento do segmento R$ 18,5 bilhões.
A Lei Eleitoral proíbe doações de entidade de classe ou sindicato. Também é vedada doação de pessoa jurídica, sem fins lucrativos, que receba recursos do exterior.
Além disso, doações de associação impedem que seja estabelecida ligação entre o real financiador e o parlamentar beneficiado.
A Interfarma nega irregularidades nas doações (leia texto nesta página).
Em 2008, o Ministério Público apresentou denúncia contra a AIB (Associação Imobiliária Brasileira) por ter bancado eleições de vereadores e do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab.
Kassab chegou a ter o mandato cassado na 1ª Zona Eleitoral, mas o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) reverteu a decisão por interpretar que não é clara a caracterização da AIB como entidade de classe ou sindical.
Laboratórios farmacêuticos pressionam o Congresso com duas linhas de interesse: o reconhecimento de patentes de medicamentos e a regra da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que impõe um selo antifraude em remédios.
As empresas defendem a manutenção das patentes e criticam o selo, sob argumento que gera custos.
A Anvisa é presidida por Dirceu Raposo de Mello, filiado ao PT, ligado ao deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).
Recentemente, a Interfarma contratou o ex-governador gaúcho Antonio Britto Filho (ex-PMDB) para presidi-la. O conselho diretor é formado por executivos das empresas transnacionais.
Ao repassar o dinheiro, a associação escolheu parlamentares influentes, de diferentes partidos. Dos 18 beneficiados, 12 se elegeram. No Senado, receberam o eleito Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), e o derrotado Fernando Pimentel (PT-MG).
A lista inclui o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), um dos favoritos para presidir a Casa. Ele ganhou R$ 150 mil.
"Algumas doações foram o partido quem indicou
Os repasses foram feitos nos dias 1, 2 e 3 de setembro.
No último dia 1º, a entidade divulgou nota sobre a eleição presidencial: "A Interfarma considera a eleição de Dilma Rousseff vitória da democracia e espera que o novo governo possa dar prioridade à questão de saúde pública".
Interfarma diz que doações respeitam a lei
A Interfarma afirmou em nota que as doações seguem "as regras vigentes" da Lei Eleitoral e que se considera uma "associação setorial". Não há citação específica na Lei Eleitoral para "associação setorial", termo que, segundo especialistas, pode ser interpretado como entidade de classe.
"Respeito absoluto à legislação e às regras vigentes. A entidade não se vale da permissão legal para fazer doações a candidatos por meio de partidos, as chamadas doações ocultas", afirmou.
Sobre a opção pelos candidatos, disse que "escolhe parlamentares federais de todas as posições políticas interessados em discutir e encontrar soluções para a saúde pública no Brasil".
Sobre a agenda da entidade no Legislativo, a associação respondeu: "Os projetos de interesse da Interfarma são aqueles que ajudem a melhorar o acesso do cidadão brasileiro à saúde".
SILVIO NAVARRO
FOLHA DE SÃO PAULO