Por: GTPI

GTPI – 09/10/2013

Com a publicação do estudo “A REVISÃO DA LEI DE PATENTES”, realizada hoje, na Câmara dos Deputados, o Brasil está diante de uma oportunidade histórica de reforçar a garantia do direito à saúde. Em meio a tantos debates sobre a quantidade e a origem dos recursos que devem ser destinados à saúde, se perde de vista o fato de que boa parte desses recursos é gasta com produtos em situação de monopólio privado. Essa é uma ameaça constante à sustentabilidade do SUS, que tem raízes na lei de patentes. O estudo, lançado pelo Centro de Estudos Estratégicos (CEDES), contribui para destacar os pontos da lei de patentes que podem ser melhorados de modo a favorecer o interesse público e ampliar o acesso à bens de saúde. Além disso, o Estudo faz recomendações aos poderes executivo e legislativo, como a aprovação de projetos de lei que já tramitam no congresso.

Boletins temáticos produzidos pelo GTPI sobre projetos de Lei em tramitação podem ser acessados aqui

“Temos muitos recursos da saúde comprometidos com a compra de medicamentos patenteados, mas não temos uma lei de patente verdadeiramente comprometida com a saúde. Modificações na lei podem aumentar as possibilidades de compra de medicamentos genéricos a preços mais acessíveis, aumentando o acesso da população e economizando recursos públicos que podem ser utilizados para a melhoria do sistema de saúde como um todo”, diz Marcela Vieira, do Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (GTPI/Rebrip). No Brasil, saúde é um direito de todos, que deve ser garantido pelo Estado; e não uma mercadoria, acessível conforme o poder aquisitivo de cada um. Mas regras comerciais, como as de propriedade intelectual, podem impedir a realização do direito à saúde, pois geram monopólios (via patente) sobre bens de saúde, dificultando o acesso a eles. O Brasil deixou de adotar medidas de proteção do interesse público, capazes de minimizar o impacto negativo das patentes na saúde, mas existem projetos de lei que podem mudar esse quadro, especialmente o PL 5.402/13, que contém uma série de reformas importantes para a saúde pública.

“A aprovação deste projeto de lei, bem como a de outros PLs que direcionam a lei de patentes para o interesse público, será um grande passo para aprofundar conquistas da sociedade civil brasileira, como a inclusão da saúde como um direito fundamental na constituição de 1988 e a distribuição universal e gratuita de medicamentos essenciais no SUS”, comenta Marcela. Cabe lembrar, por exemplo, que o programa brasileiro de Aids já foi ameaçado pelo alto custo de medicamentos patenteados. O risco de “descontinuidade” da distribuição de medicamentos foi anunciado pelo Ministério da Saúde em 2005, em razão do alto preço cobrado pela empresa Abbott para o lopinavir/ritonavir (kaletra), protegido por patente na época.
 

“É evidente que a garantia de direitos envolve custos, mas a pergunta fundamental não deve ser nunca sobre a interrupção desses direitos e sim sobre as razões dos custos elevados. Nossa perspectiva é sempre de que direitos humanos são incontestáveis, patentes não”, afirma Marcela.

Nesse sentido, as constatações contidas no Estudo “A REVISÃO DA LEI DE PATENTES” deixam claro que a adoção do sistema de patentes no Brasil elevou o “custo” do direito à saúde, mas não trouxe o retorno prometido. Desse modo, o Congresso brasileiro está se alinhando com a percepção global de que o reconhecimento de patentes na área farmacêutica foi fundado em promessas que até hoje não foram cumpridas. Promessas como investimentos, transferência de tecnologia e aumento da inovação. “ O sistema de patentes se desviou de seu propósito original e ao invés de estimular inovações genuínas está a serviço de estratégias ofensivas de patenteamento, focadas em inovações pouco relevantes usadas apenas para afastar competidores e aumentar os lucros das empresas detentoras das patentes. Uma revisão da lei de patentes é inevitável em qualquer pais que leve a sério o interesse público. O Brasil já tapou o sol com a peneira por tempo demais, se não agirmos agora, ficaremos cegos”, complementa Pedro Villardi, pesquisador da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) e também membro do GTPI. “O Estudo é um marco no Brasil e deve ser encarado como um alerta sobre a armadilha em que caímos com a assinatura do Acordo TRIPS da OMC (Acordo sobre Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio da Organização Mundial do Comércio) e como uma convocação para que os três poderem ajam agora para garantir que patentes não ameacem o direito à saúde no futuro.”