Mais de 5 mil pacientes serão beneficiados, mas abuso de poder econômico por empresas estrangeiras coloca em risco a vida de outras milhares de pessoas.

O Ministério da Saúde inicia hoje a distribuição de versões genéricas do medicamento sofosbuvir para atender demandas de pacientes com hepatite C que aguardam desde 2017.

Mais de 15 mil pacientes estão na fila para receber o tratamento composto pelos medicamentos Sofosbuvir + Daclatasvir e com taxa de cura de 95%.

Nos últimos meses, uma guerra judicial e comercial para bloquear a entrada do genérico prolongou a espera dos pacientes, culminando no impedimento da entrega dos medicamentos no armazém do ministério da saúde no dia 19/12 por determinação da 14a Vara Federal. No dia 26/12 o TRF1 suspendeu a liminar autorizando a entrega dos medicamentos.

A distribuição dos genéricos representa a perda de exclusividade da empresa Gilead, dos Estados Unidos, sobre a venda do sofosbuvir no Brasil. Entre 2015 e 2017 os preços elevados da Gilead forçaram o racionamento do tratamento apenas para os pacientes em estado mais grave. Hoje a oferta é irrestrita e a concorrência com genéricos é essencial para a garantia de preços sustentáveis.

Entretanto, desde julho a Gilead tem contestado, inclusive judicialmente, o resultado de reuniões de tomada de preço e pregões em que não saiu vitoriosa, sendo a ação na 14a Vara a mais recente movida pela empresa.

No último pregão, realizado em 27/11, a a empresa Blanver, produtora do genérico ofertou o menor preço. A economia só não será maior porque a empresa Bristol (BMS), fabricante do medicamento Daclatasvir (usado em combinação com o sofosbuvir) aumentou o preço de U$7,35 por unidade (preço oferecido em julho) para U$24,50, encarecendo assim o custo total do tratamento.

Além disso, para o fornecimento do tratamento para os 15 mil pacientes que estão na fila há mais tempo, a Bristol realizará a entrega ao Ministério em 3 lotes, o primeiro já realizado e o ultimo previsto para junho de 2019, prolongando assim o tempo de espera e prejudicando ainda mais os pacientes.

Patente da Gilead não impede produção nacional

A Gilead por sua vez segue atuando para bloquear seus competidores seja por meio de ações judiciais seja por meio da alegação que detém uma patente sobre o medicamento. Patente esta que foi suspensa em setembro por decisão judicial e que, mesmo se considerada válida, foi classificada pelo ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Jorge Lima como incapaz de bloquear a produção nacional de genéricos, em audiência realizada no Senado Federal em 13/11.

A concorrência também tem feito a Gilead reduzir os preços para uma outra opção de tratamento, o medicamento Epclusa (Sofosbuvir+Velpatasvir), no marco de um processo em curso para a aquisição de mais 50 mil tratamentos.

“As empresas estrangeiras Gilead e Bristol demonstram não ter respeito pela vida dos pacientes. Também mostram que essas empresas não tem compromisso com o princípio da universalidade do SUS ao cobrarem preços abusivos, adotarem práticas anticoncorrenciais, que causaram atrasos na entrega dos medicamentos a pessoas que já passaram por tanta angustia e sofrimento. Essas violações não podem passar impunes”, disse o coordenador do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI), Pedro Villardi.

“O Estado brasileiro precisa agir para impedir que ações deletérias por parte de Gilead e da Bristol voltem a acontecer. A chegada dos genéricos é um grande avanço e alinha o Brasil com o que recomendam todas as estratégias globais. É lamentável que colocar a oferta de genéricos em prática gere pressões contrárias com um custo humano tão elevado”, aponta o coordenador.