Encerramento não foi divulgado publicamente pelos funcionários, que proibiram os pesquisadores de discutir o que aconteceu

Autoridades federais não divulgaram publicamente o recente desligamento das pesquisas sobre HIV pelo governo Trump envolvendo tecido fetal. O estudo estava sendo conduzido pelo National Institutes of Health.

A administração Trump fechou pelo menos um estudo do governo, que usa tecido fetal implantado em camundongos, mesmo antes das autoridades federais de saúde chegarem a uma decisão se devem ou não continuar tais pesquisas, às quais se opõem grupos antiaborto.

Um cientista sênior de um laboratório do National Institutes of Health (NIH), em Montana, disse aos colegas que o Departamento de Saúde e Serviços Humanos o orientou a descontinuar a aquisição de tecido fetal” por uma empresa que é a única fonte disponível, de acordo com um email enviado a um colaborador no final de setembro.

“Isso efetivamente impede toda a nossa pesquisa para descobrir uma cura para o HIV”, escreveu o cientista. A perspectiva é que as interrupções se estendam a vários outros laboratórios que utilizam tecido fetal que fazem parte do NIH.

O fechamento da pesquisa sobre o HIV no laboratório federal em Montana, publicado pela primeira vez na Science, nunca foi divulgado publicamente por autoridades do governo, que proibiram os pesquisadores afetados de discutir o que aconteceu. Mas outros cientistas estão se manifestando indignados com a ação, que alimentou uma controvérsia que coloca a comunidade de pesquisa biomédica contra ativistas antiaborto e outros conservadores sociais que pressionam a administração para parar o fluxo de doações federais e contratos de trabalho envolvendo tecido fetal, oriundo de abortos eletivos.

“Isso é censura científica do pior tipo”, disse o diretor do Instituto Gladstone de Virologia e Imunologia, Warner Greene. Ele estava pronto para colaborar com o pesquisador de Montana, Kim Hasenkrug, em um novo experimento que foi frustrado.

“Você passa a sua vida tentando fazer boas experiências e organizar sua ciência com cuidado”, disse Greene, “e de repente, ao sabor de alguns políticos em Washington, eles removem uma parte crítica do seu arsenal científico”.

Em Montana, Hasenkrug não estava disponível para comentar. Greene e o pioneiro na pesquisa com células-tronco na Universidade de Stanford, Irving Weissman, afirmaram que autoridades do governo impuseram a ordem de não se manifestar.

Um porta-voz do NIH disse que, quando o HHS começou sua revisão do tecido fetal em setembro, o NIH colocou em prática uma “pausa” na aquisição desse tipo de tecido. Os pesquisadores foram instruídos a notificar para os altos funcionários caso precisassem de mais. A porta-voz disse que o NIH está investigando por que isso não aconteceu com a pesquisa de Hasenkrug.

As notícias do estudo interrompido ampliam as ações conhecidas de obstrução de pesquisas por parte da administração. No final de setembro, o HHS anunciou o término de um contrato da Food and Drug Administration (FDA) com uma empresa californiana, a Advanced Bioscience Resources, e informou a condução de uma “auditoria” sobre se deveria continuar a financiar a pesquisa com tecido fetal “com a única empresa nos EUA capaz de fornecer tecidos adequados para a pesquisa [rato humanizado]”.

Nas últimas duas semanas, um pesquisador do principal laboratório acadêmico de São Francisco foi informado pela primeira vez que um contrato do NIH, de sete anos, não estava sendo estendido para o ano seguinte. A universidade então recebeu informações revisadas de que o laboratório estava recebendo 90 dias de financiamento, com o restante incerto.

O laboratório da Universidade da Califórnia, em São Francisco, é um elemento essencial no desenvolvimento de novos medicamentos para prevenir e tratar o HIV, usando camundongos implantados com tecido fetal humano para a execução dos primeiros testes em animais, usando compostos químicos desenvolvidos por empresas farmacêuticas e outros cientistas acadêmicos que parecem promissores nos ratos de laboratório.

Na semana passada, funcionários do HHS e do NIH negaram que tivessem dito inicialmente ao laboratório da UCSF que o contrato estava terminando. As autoridades disseram que nenhuma decisão seria tomada até que o HHS concluísse a auditoria do financiamento governamental para tecido fetal. A reconsideração estaria centrada na avaliação de alternativas adequadas, a exemplo do que argumentam os adversários do tecido fetal. Os cientistas contestam.

As autoridades estão preparadas para dar extensões de 90 dias a outros laboratórios externos que utilizam tecido fetal, cujas concessões ou contratos são renovados antes da conclusão da auditoria seja concluída.

Publicado em The Washington Post

Com imagem de Pablo Martinez Monsivais/Associated Press