Analisar as ambiguidades e tensões do papel da camisinha no debate da prevenção foi o objetivo da palestra do vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), Veriano Terto. A apresentação fez parte da mesa redonda Prevenção do HIV, IST e Hepatites Virais na População de Gays e outros HSH: como repensar o preservativo masculino, o homoerotismo e as abordagens de prevenção combinada, na sala Londrina, na tarde dessa segunda-feira (27).

“Desde a década de 1980, as representações e ambiguidades seguiram mudando. Por exemplo, a camisinha já foi vista pela população gay nesse período como um instrumento de cerceamento das liberdades sexuais conquistadas, ao mesmo tempo que significou uma liberdade porque permitiu manter essas práticas e negar a própria Aids”, explicou Terto, destacando ainda a mudança da ideia do preservativo que simbolizava o contraceptivo à geração de uma nova vida para ser salvador de vidas.

Nos anos 1990, Terto lembrou que a camisinha era uma parte da ideia de sexo seguro, porém, com a cooptação dos profissionais de saúde e de técnicos ao discurso do sexo seguro, a camisinha foi ganhando cada vez mais relevância até se estabelecer como sinônimo de seguro”.

Sobre os anos 2000, Terto apontou o predomínio de um discurso conservador no âmbito social e cultural, momento em que a camisinha é reconhecida  como a única forma de sexo seguro possível. “É o inicio da ditadura da camisinha, do ‘use sempre camisinha’ em todas as relações sexuais. O discurso prescritivo passa a dominar. E normativo porque se você não usa é irresponsável”.

Paradoxos do acesso e da sexualidade

Entre outros paradoxos, Terto destacou o do acesso, no momento em que pesquisas começaram a registrar um “cansaço” no uso do preservativo. “Na década de 2010, enquanto a população LGBT manifestava uma fadiga, a camisinha sequer havia chegado em escolas, presídios e uma série de lugares”, comentou.

Outro destaque apresentado foi a oscilação do papel da sexualidade nas discussões, campanhas. “A partir do ano 2000, a sexualidade que sempre esteve presente na prevenção nas décadas de 1980 e 1990 começa a desaparecer. Agora no final dos anos 2010 parece que estamos nessa perspectiva de retomada, a exemplo do clipe da Pablo Vittar”, explica o ativista, a respeito do aparecimento da camisinha numa situação em que a artista trans e o cantor interagem em um carro numa situação preliminar de relação sexual.