Evento paralelo denuncia violações de direitos humanos dentro do sistema de patentes e demanda que corporações farmacêuticas parem ataques contra medidas de proteção da saúde do Brasil e da Argentina

10/03/2016 – Genebra – Grupos da sociedade civil do Brasil e da Argentina vão realizar amanhã um evento paralelo na 31a sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU) para anunciar a campanha denominada “Corporações farmacêuticas: Larguem o caso”. A campanha demanda o abandono de casos judiciais iniciados por associações de empresas transnacionais farmacêuticas em ambos os países com o intuito de desmontar regulações locais consideradas importantes medidas de defesa da saúde. Uma petição global será lançada em 3 idiomas nas páginas: redlam.org e www.deolhonaspatentes.org.

O evento paralelo é chamado “Vancouver e TRIPS 20 anos depois: Barreiras para o acesso a medicamentos hoje” e vai acontecer no dia 11/03 na Sala XXIV, entre 17h e 18h (13h – 14h no horário do Brasil).

Transmissão ao vivo estará disponível emhttp://www.treatybodywebcast.org/treaty-body-webcast-ii/

A Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA) estará representada por Marcela Vieira, coordenadora do Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual (GTPI). De acordo com Marcela, o objetivo do evento é evidenciar que muitos dos objetivos globais de saúde que estão sendo promovidos pela ONU, como o fim da AIDS como epidemia até 2030, só poderão ser atingidos quando barreiras sistêmicas ao acesso a medicamentos forem devidamente enfrentadas.

Vinte anos após a histórica Conferência Internacional de AIDS de Vancouver, quando a ciência provou que o tratamento poderia acabar com as mortes por AIDS, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que existem ainda 22 milhões de pessoas sem acesso ao tratamento e 1 milhão de pessoas morrem de AIDS todo ano.

“O sistema de patentes está falhando com as pessoas, ele favorece os interesses das corporações acima dos interesses da saúde pública. O sistema se tornou uma máquina de monopólios intermináveis sobre medicamentos essenciais, uma máquina de violações do direito à saúde. O que vemos no Brasil e na Argentina é que mecanismos criados para colocar um limite em abusos de patente estão sob ataque, então o direito à saúde está ainda mais vulnerável”, diz Marcela.

Lorena Di Giano, Diretora Executiva da Fundación Efecto Positivo (FGEP), Coordenadora-Geral da RedLam e co-organizadora do evento considera que os ataques judiciais no Brasil e na Argentina precisam de mais visibilidade das agências internacionais. “Esses ataques são um grave sintoma da profunda crise que vivemos hoje. As empresas representadas pelas associações que estão realizando esses ataques – CAEME na Argentina e Interfarma no Brasil – não usam o sistema de patentes em prol da inovação e sim para bloquear a concorrência e levar sistemas de saúde à falência”, diz Lorena.

A OMS estima que as mortes de cerca de 18 milhões de pessoas, um terço de todas as mortes da humanidade, são causadas por condições médicas que poderiam ser tratadas ou curadas. Uma razão primária para essas mortes evitáveis é a falta de acesso a tratamentos efetivos a um preço baixo.

O alto preço de medicamentos não é uma barreira para o acesso apenas em países de renda baixa e média, mas também em países de renda alta. O exemplo que está na ordem do dia é o novo medicamento usado para tratar a Hepatite C, chamado sofosbuvir (sovaldi ®, Gilead). O preço é tão alto que muitos países da Europa não o disponibilizaram em sistemas públicos de saúde, como foi o caso do Reino Unido. Na França, pela primeira vez o preço de um medicamento levou ao racionamento do tratamento no país. Pauline Londeix, co-fundadora e coordenadora da ONG “Acess”, baseada na França, e uma das panelistas do evento paralelo diz: “Os preços de medicamentos estão tão altos que estamos nos aproximando do ponto em que nenhum país do mundo vai ser capaz de oferecer acesso universal para sua população sem colocar a sustentabilidade dos sistemas públicos de saúde em risco.”

Tanto o Brasil como a Argentina possuem sistemas de saúde públicos e universais, que fornecem
medicamentos gratuitamente para todos. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de pessoas mantendo um sistema público de saúde. Esses países precisam garantir preços sustentáveis para medicamentos e criaram critérios e procedimentos rigorosos para o exame de patentes na área farmacêutica. Como resultado, ambos os países conseguiram bloquear diversas patentes imerecidas, garantindo concorrência de genéricos e reduções de preço importantes para medicamentos essenciais.

Entretanto, Interfarma e Caeme, associações de empresas farmacêuticas transnacionais ingressaram com ações na justiça em 2014 e 2015 em busca da anulação desses mecanismos. Se os Tribunais julgarem a favor das empresas, milhões de pessoas nesses países podem ficar sem acesso a medicamentos genéricos de preço baixo. Os impactos em programas de acesso universal a medicamentos e nas contas públicas podem ser dramáticos.

De acordo com investigação conduzida pela Comissão Européia e com foco na indústria farmacêutica, governos europeus e consumidores pagaram cerca de 3 bilhões de euros em excesso entre 2000 e 2007 (em relação a 2019 medicamentos) por causa de abusos  no exercício de direitos de patente.

“Empresas atacam nossas medidas de proteção à saúde dizendo que fazem isso para proteger suas patentes. Então eu pergunto quem está protegendo as pessoas? Os direitos humanos não estão sendo aplicados para proteger as pessoas de abusos de patentes, é hora de mudar isso antes que percamos todas as nossas conquistas relacionadas ao direito à saúde”, diz Lorena.

SERVIÇO: VANCOUVER e TRIPS 20 ANOS DEPOIS: BARREIRAS PARA O ACESSO A MEDICAMENTOS HOJE

11 de Março de 2016; 5pm-6pm
ROOM XXIVO TRIPS falhou com as pessoas: Como o sistema de patentes favorece coporações acima da saúde.
Mr. Carlos Correa – Diretor do  Centro De Estudos Interdisciplinares em Propriedade Industrial e Economia,
Universidade de Buenos Aires, ArgentinaFalta de Inovação e acesso a medicamentos: Um problema apenas dos países em desenvolvimento? O caso do HIV e do HCV em países ricos.
Ms. Pauline Londeix – Co-foundadora e Coordenadora da Access, França.Soberania e salvaguardas do TRIPS: desafios enfrentados pelo Brasil e a Argentina para proteger o direito à saúde.
Ms. Marcela Vieira, Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), Coordenadora do
Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual (GTPI), membra da Rede Latino-Americana pelo Acesso a Medicamentos (RedLam), Brasil.