Na foto acima, comissária Margarette May Macaulay expõe seus comentários e questões na audiência regional “Direito à saúde e falta de medicamentos nas Américas” na Comissão Intermericana de Direitos Humanos.

7 de dezembro de 2016

O Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI) denunciou ontem, 6, a situação do direito ao acesso a medicamentos no Brasil em audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Juan Carlos Raxach, ativista da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) e soropositivo há 30 anos, representou o GTPI na audiência.

Juan expôs os impactos negativos que a aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) 55/2016 terá no investimento em saúde pública. A redução do gasto per capita nos próximos 20 anos em saúde irá  agravar a situação já subfinanciada do Sistema Único de Saúde (SUS). Além disso, o ativista contextualizou que o ajuste estrutural ocorre dentro de um quadro de redução dos espaços democráticos e de favorecimento dos interesses privados.

A denúncia do caso brasileiro destacou também o papel das farmacêuticas multinacionais na perda de direitos conquistados. Por um lado, a cobrança de preços extorsivos aos medicamentos tem sistematicamente ameaçado a sustentabilidade  e a universalidade do SUS. Por outro, ataques de farmacêuticas a mecanismos institucionais legítimos têm posto em xeque a capacidade estatal de proteger a  saúde frente ao mal funcionamento do sistema de patentes.

É o caso do ataque, inclusive pela via judicial, da associação de farmacêuticas transnacionais INTERFARMA contra a anuência prévia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), responsável por contribuir com o rigor do exame de pedidos de patentes de medicamentos à luz da saúde pública.

derecho-a-la-salud-_-159-periodo-ordinario-de-sesiones-en-pa-_-flickr-2016-12-07-17-57-06

Da esquerda para direita, Juan Carlos Raxach, Jose Maria Di Bello e Francisco Rossi.

“O que estamos vivendo no Brasil se repete na região: para população, perda de direitos; para as empresas, uma arquitetura de impunidade”, conclui Juan Carlos Raxach em sua exposição.

Veja na íntegra a  intervenção de Raxach aqui.

É a primeira vez que a Comissão Interamericana celebra uma audiência regional sobre direito à saúde e falta de medicamentos nas Américas. A audiência foi resultado da articulação de mais de 25 organizações e redes da sociedade civil da região, demonstrando o impacto das patentes no direito à saúde em uma dimensão regional e global.

Dentre as principais preocupações expostas, estava a falta de pesquisa e desenvolvimento em doenças negligenciadas, os altos preços dos medicamentos, a falta de acesso a medicamentos genéricos, o papel de empresas farmacêuticas e o fracasso dos Estados no desenho e utilização de políticas públicas que garantam o direito à saúde de suas populações. Além do caso brasileiro, foram denunciados casos emblemáticos na Colômbia, Peru, Argentina e Guatemala.

Os comissários da CIDH presentes na audiência expressaram a importância do direito ao acesso a medicamentos no contexto interamericano e sua disposição em avançar em sua proteção nas Américas. O comissário Paulo Vannuchi, atual relator da Unidade de Direitos Econômicos Sociais e Culturais da CIDH, destacou a coragem de países que usaram licenças compulsórias na região e que “o direito à vida é mais importante que a propriedade intelectual”.

O comissário Francisco Eguiguren pontuou que “o direito à saúde deve primar sobre a propriedade intelectual” e que o “Estado tem o dever de garantir o direito à saúde, e esta não pode ser deixada à condição do mercado”. A comissária Margarette May Macaulay reforçou que a lógica no acesso a medicamentos “não pode estar baseada em quem pode pagar ou não”, e chamou à atenção para a vulnerabilidade de crianças e pessoas idosas.

A audiência foi celebrada em um momento decisivo para a defesa dos direitos sociais nas Américas. No marco do período de sessões da CIDH, foi anunciada a concretização da Relatoria Especial para os Direitos Sociais, Econômicos e Culturais (DESC) da CIDH, que irá suceder a atual Unidade DESC e significará maiores recursos para monitorar tais direitos na região.

Veja na íntegra a audiência aqui.