Com o painel “As Vozes da Vítimas”, a coordenadora geral da Rede Latinoamericana por Acesso a Medicamentos (RedLam) e membro do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI), Lorena Di Giano, apontou na manhã desta sexta-feira (27), casos de violação de Direitos Humanos por parte das empresas farmacêuticas na América Latina, na reunião especial do Conselho de Direitos Humanos convocada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em Genebra.
Foram relatadas várias situações de abuso por parte de empresas farmacêuticas relacionadas à emissão de patentes e pelo ambiente de insegurança jurídica causado pelas investidas legais dos laboratórios ao solicitar patentes, o que ocasiona em várias partes do mundo a privação do acesso por parte das pessoas que precisam acessar medicamentos e tratamentos essenciais.
“Os medicamentos são bens sociais, mas são desenvolvidos sob um critério de lucro”, afirmou Di Giano. Para ela, o sistema mundial de patentes é o resposável direto por permitir abusos com base no princípio dos medicamentos enquanto mercadorias e, portanto, passíveis de preços exorbitantes.
A apresentação fez parte da terceira sessão do Grupo de Trabalho Aberto Intergovernamental sobre Empresas Transnacionais e outras empresas com relação à Direitos Humanos (OEIGWG), que discute o texto de um Tratado Vinculante para regular as atividades das Corporações Transnacionais (TNCs) e outras empresas de negócio (OBEs) em defesa dos Direitos Humanos.
“É necessária a aprovação de um instrumento legal efetivo que atue como marco legal obrigatório para garantir o direito à saúde e controlar os abusos empresariais que se dão, principalmente, por preços extorsivos e as normativas de propriedade intelectual em favor do mercado”, considerou Di Giano, ao se referir sobre a proposta de texto do Tratado Vinculante defendido por representantes da sociedade civil de todo o mundo presentes no evento.
Proteger o Estado e as populações
O objetivo do Tratado Vinculante é proporcionar aos estados nacionais mecanismos legais e outros meios possíveis para o resguardo de atividades predatórias de empresas transnacionais que atentam contra os princípios internacionais dos Direitos Humanos, sobretudo em áreas como a soberania alimentar, do território e no cuidado com o meio ambiente, bem como a proteção do direito à saúde e o acesso a medicamentos.
As tarefas do Grupo de Trabalho para a adoção do Tratado Vinculante foram coordenadas pelo “Documento de Elementos”, apresentado pelo Governo do Equador e debatido durante as sessões da reunião especial, recebendo o apoio de vários países membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
União Europeia investiu contra o Tratado
A semana foi marcada por tentativas de atraso e boicote ao processo do Tratado Vinculante por parte da União Europeia. A informação é do coordenador do GTPI, Pedro Villardi, que está em Genebra e constatou que, desde o primeiro dia, a representação da UE tentou interromper as discussões, ora contestando o período de permanência da presidência das sessões por parte do Equador, ou mesmo a legitimação da continuidade dos trabalhos pelo grupo intergovernamental sem uma resolução que renovasse este mandato.
“Ocorre que em 2014, o Conselho de Direitos Humanos aprovou a resolução 26/9, que criou o Grupo de Trabalho prevendo que o mesmo teria três sessões para apresentar os elementos do Tratado Vinculante”, disse Villardi. Na presidência, o Equador deixou claro que queria continuar o trabalho em 2018, mesmo após as três sessões, sob a interpretação de que o grupo tem mandato para continuar até que exista de fato um tratado. A argumentação teve por base a expressão “Aberto” da própria nomeclatura do GT.
“A resolução pedida pela UE acabaria com o processo do Tratado, porque com a atual composição do Conselho de Direitos Humanos seria muito difícil ter essa aprovação. A sessão foi extremamente tensa até a final, mas o processo segue vivo ainda que por um fio, o que torna agora imprescindível intensificar a luta e a mobilização. Os Direitos Humanos estão acima do lucro das empresas”, disse Villardi.
Sobre o GTPI e RedLam
O GTPI é um coletivo de 15 organizações criado em 2003 que reúne pesquisadores e ativistas na busca de alternativas para minimizar o impacto das patentes farmacêuticas no acesso aos medicamentos essenciais.
A RedLam integra redes e organizações do Brasil, Argentina, Colômbia, México e Peru pela promoção do acesso universal aos medicamentos e a melhoria da qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV/Aids, e faz parte da Campanha Global para Reivindicar a Soberania dos Povos, Desmantelar o Poder Corporativo e pelo Fim da Impunidade das Empresas.
Desde o início do evento, uma forte campanha global está nas redes sociais em favor do Tratado Vinculante e pelo fim das pressões de blocos contrários à medida. No Twitter, a cobertura pode ser acessada pelo perfil @StopTNCimpunity ou pelas hashtags #TratadoVinculante #BindingTreaty.
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