Nesta sexta-feira, dia 7 de abril, o Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (GTPI/Rebrip), coordenado pela Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), protocolou na 16ª Vara Federal do Distrito Federal um amicus curiae. A peça contém argumentos jurídicos e técnicos para auxiliar o juiz da Ação Coletiva 0087409-43.2014.4.01.3400, iniciada pela Interfarma com o objetivo de alterar a forma como monopólios sobre medicamentos são autorizados no país.

A Interfarma reúne as maiores empresas multinacionais do setor farmacêutico e faz lobby no Brasil por regras que permitam monopólios mais frequentes e longos sobre medicamentos usados pela população. Por meio desta ação, a Interfarma pede o definitivo afastamento da Anvisa da análise de mérito dos pedidos de patentes farmacêuticas. A patente é um instrumento comercial que permite no mínimo 20 anos de monopólio sobre uma tecnologia. Estabelecida desde 2001, a participação da Anvisa (Anuência prévia) é considerada uma medida preventiva, que torna o exame mais rigoroso impedindo a aprovação de patentes de baixa qualidade – Aquelas que não contém inovação relevante e são usadas apenas para gerar bloqueios à entrada de genéricos mais baratos.

Em março, o Ministério Público Federal se manifestou considerando improcedente a ação da Interfarma e ressaltando que “deve ser prestigiada a interpretação segundo a qual a Anvisa pode, no exercício de sua atribuição prevista no artigo 229-C da lei de propriedade industrial, avaliar não só a nocividade do fármaco, como também os riscos de se restringir o acesso a medicamentos que envolvem a concessão de patentes”. O amicus do GTPI também contesta a Interfarma.

 

No entanto, diversas decisões judiciais tem replicado os argumentos da Interfarma, de modo a invalidar as decisões da Anvisa. Esse impasse impede o uso de genéricos e economias para o SUS. De acordo com Pedro Villardi, coordenador do GTPI, “Alguns casos são emblemáticos da contribuição da ANVISA, mas que não tiveram o efeito desejado: Recentemente, a ANVISA negou a patente do sofosbuvir, o medicamente que cura a Hepatite C. Se essa decisão for cumprida, o Brasil pode ter acesso a preços quase 8 vezes menores do que é pago hoje. Isso significa poder tratar milhares de pessoas a mais, que hoje não tem direito ao medicamento por não estarem ainda no estágio mais grave da doença. Mas é possível que a população não se beneficie dessa decisão, pois a Interfarma conseguiu difundir sua tese de que a participação da Anvisa é inválida”.

Além da disputa nos tribunais, também tramita um acordo entre Anvisa e Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI. Tal acordo enfraqueceria os poderes da Anvisa de rejeitar patentes, tornando a agência um mera instância consultiva. “Consideramos este acordo ilegítimo, pois não foi fruto de nenhum debate ou consulta junto à sociedade. Não podemos abrir mão da participação da Anvisa, ainda mais num momento em que o sistema de patentes funciona mal, trazendo prejuízos incalculáveis para a saúde pública.”

 

Em levantamento feito pelo GTPI, foi identificado que a rejeição pela Anvisa da patente do medicamento docetaxel, utilizado no tratamento de câncer, fez o Brasil economizar apenas em 2013, mais de R$6 milhões. No caso do medicamento antiepilético pregabalina, que também teve patente negada em 2010, após a participação da Anvisa, hoje o Brasil tem acesso a versões genéricas a preços quase 22 vezes menores do que o comercializado pela empresa detentora da patente. No entanto, também foram identificados casos em que a contribuição da Anvisa foi bloqueada pelo próprio INPI. É o caso do medicamento para câncer afatinibe. Em outubro de 2014, a ANVISA encaminhou ao INPI parecer de não anuência, mas até hoje o INPI não publicou a decisão. Ou seja, o pedido de patente continua pendente e a empresa que solicitou a patente continua comercializando o medicamento em uma situação de monopólio de fato, sendo a única com registro do medicamento no país.